O inventariante é figura central no processo de inventário. Cabe a ele representar o espólio em juízo, prestar as primeiras e últimas declarações, administrar os bens, prestar contas e adotar medidas para preservação do patrimônio até que a partilha seja concluída. Diante da relevância de sua função, a lei estabelece hipóteses claras — e, conforme entendimento do Superior Tribunal de Justiça (STJ), não exaustivas — em que o inventariante poderá ser removido.
Hipóteses Legais de Remoção
O artigo 622 do Código de Processo Civil prevê que o inventariante pode ser removido de ofício pelo juiz ou a requerimento das partes ou do Ministério Público, quando for o caso. Essa possibilidade de remoção sem provocação das partes reforça o dever do magistrado de zelar pelo andamento regular e eficiente do processo.
As hipóteses legais expressamente previstas para a remoção são:
Falta de apresentação das primeiras ou últimas declarações dentro do prazo legal: o descumprimento desse dever formal, especialmente quando se prolonga injustificadamente, compromete o andamento do processo e justifica a substituição do inventariante.
Falta de impulso ao processo ou prática de atos protelatórios: situações em que o inventariante, por inércia ou intenção deliberada, dificulta o regular andamento da sucessão, como quando há favorecimento de certos herdeiros ou má gestão dos bens.
Dano, dilapidação ou deterioração de bens por culpa ou dolo: mesmo que o inventariante não seja diretamente responsável por um evento danoso, sua omissão em adotar providências pode configurar negligência, como ocorre em casos de imóveis danificados que não recebem manutenção adequada.
Omissão na defesa do espólio ou inércia na cobrança de créditos: o inventariante deve agir com diligência para proteger o espólio, inclusive ajuizando ações ou cobrando dívidas. A inércia injustificada, ainda que por motivos pessoais, fere os interesses dos herdeiros e autoriza a remoção.
Prestar contas irregulares ou não prestar contas: se o inventariante não presta contas, ou o faz de maneira incompleta ou imprecisa, será removido. As contas devem ser julgadas “boas”, ou seja, claras, comprovadas e em conformidade com a finalidade da função.
Ocultação ou desvio de bens do espólio: conduta grave, que implica má-fé e quebra do dever de lealdade. A ocultação ou apropriação indevida de bens pode, além da remoção, ensejar responsabilização cível e até penal.
Rol Exemplificativo e Conflitos entre Herdeiros
A jurisprudência do STJ entende que o rol previsto no artigo 622 é meramente exemplificativo, o que significa que outras condutas não previstas expressamente, mas que prejudiquem a lisura do inventário, podem justificar a remoção.
Um exemplo é a excessiva animosidade entre os herdeiros. Quando o inventariante não consegue conduzir o processo de forma imparcial devido a conflitos intensos com os demais interessados, a remoção pode ser decretada. Nesses casos, é comum a nomeação de inventariante dativo — pessoa de confiança do juízo, alheia à disputa, que assume a condução do inventário para garantir neutralidade.
Procedimento para Remoção
A remoção se dá por meio de incidente processual apensado aos autos do inventário. Embora a falta de instauração formal desse incidente possa ser apontada, o STJ entende que não há nulidade se forem respeitados o contraditório e a ampla defesa.
Aberto o incidente, o inventariante terá o prazo de 15 dias para apresentar defesa e provas. Ao final, o juiz decide mediante decisão interlocutória, que é agravável (art. 1.015, parágrafo único, do CPC). Como se trata de uma decisão que não põe fim ao processo, mas resolve uma questão relevante, cabe agravo de instrumento, com possibilidade de pedido de efeito suspensivo conforme o artigo 995, parágrafo único, do CPC.
Efeitos da Remoção
Decidida a remoção, o juiz nomeará um novo inventariante. O anterior deverá imediatamente entregar todos os bens, documentos e valores do espólio ao substituto. Caso se recuse, poderá ser compelido por mandado de busca e apreensão (para bens móveis) ou por imissão na posse (para bens imóveis), conforme previsto no artigo 625 do CPC. Ainda, o juiz poderá fixar multa de até 3% do valor dos bens do espólio, como forma de coagir o cumprimento da ordem judicial.
Considerações
A remoção do inventariante é medida excepcional, mas necessária para preservar a regularidade do processo de inventário. Sua função é essencialmente fiduciária, voltada à boa administração do espólio e à garantia dos direitos dos herdeiros. Quando o titular desse cargo desvirtua suas obrigações ou demonstra parcialidade, o ordenamento jurídico fornece os meios adequados para sua substituição, sempre com observância do contraditório, da ampla defesa e da boa-fé processual.