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Princípio da Legalidade: como ele se aplica no Direito

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Princípio da Legalidade: como ele se aplica no Direito

No artigo de hoje vamos conhecer um dos princípios basilares do Estado Democrático de Direito: o Princípio da Legalidade, e como ele se aplica em todo sistema constitucional.

É fácil presumir que o princípio em questão seja totalmente compreendido, devido à sua óbvia presença nos materiais de estudo Jurídicos. No entanto, percebi que, mesmo no campo jurídico, que sua aplicação prática revela nuances muitas vezes negligenciadas até mesmo por profissionais experientes. Por isso, sempre sustento que o conhecimento, por mais elementar que pareça, nunca deve ser subestimado.

Em especial no estudo dos princípios constitucionais, detalhes aparentemente simples podem representar a diferença entre o êxito e o equívoco na atuação jurídica.

Minha missão aqui é não esgotar o assunto e enchê-lo de doutrina. objetivo é, através de forma objetiva e sazonal, trazer um esclarecimento claro dos elementos básicos sobre o princípio da legalidade, não deixando de lado alguns posicionamento de alguns doutrinadores do Direito.

Conceito e fundamentos constitucionais do princípio da legalidade

O princípio da legalidade é um dos fundamentos essenciais do Estado Democrático de Direito, servindo como uma proteção crucial tanto para o cidadão quanto para a operação da Administração Pública.

Ele afirma que “ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer algo senão em virtude de lei”.

Essa norma não só protege as liberdades individuais, como também estabelece restrições claras à ação do Estado. Sua base está intimamente ligada ao controle do poder, prevenindo abusos e assegurando previsibilidade e segurança nas questões jurídicas.

No sistema jurídico brasileiro, o princípio da legalidade está registrado no artigo 5º, inciso II, da Constituição Federal de 1988, que afirma: “ninguém pode ser compelido a realizar ou deixar de realizar algo, exceto em razão de lei.”

Além disso, o artigo 37, caput, da mesma Constituição destaca a legalidade como um dos princípios fundamentais que orientam a Administração Pública:

A abrangência do bloco de legalidade no ordenamento jurídico brasileiro

Esses instrumentos evidenciam que a legalidade possui duas dimensões: de um lado, assegura a autonomia do indivíduo, permitindo que este aja de maneira livre, desde que suas ações não estejam proibidas por dispositivos legais;

por outro lado, estabelece que a Administração Pública deve atuar sempre dentro dos parâmetros da lei, sendo-lhe proibido introduzir mudanças na ordem jurídica sem a devida autorização legal.

Sob a ótica constitucional, o princípio da legalidade deve ser interpretado de maneira ampla. Tanto a jurisprudência quanto a doutrina atuais tendem a entender o termo “lei” de forma abrangente, englobando o que se denomina bloco de legalidade.

Esse bloco é composto não apenas por leis formais, mas também por outras normas e instrumentos jurídicos que estejam hierarquicamente inferiores, contanto que respeitem os limites e fundamentos estabelecidos pela legislação superior.

Dessa forma, a obrigação da legalidade inclui normas constitucionais, leis complementares, leis ordinárias, medidas provisórias, decretos legislativos, resoluções, atos administrativos, instruções normativas, costumes e princípios gerais do Direito.

CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988 TRATADOS E CONVENÇÕES INTERNACIONAIS
CONSTITUIÇÕES ESTADUAIS E LEIS ORGÂNICASMEDIDAS PROVISÓRIAS
LEIS ORDINÁRIAS E COMPLEMENTARESRESOLUÇOES
ATOS ADMINISTRATIVOS INSTRUÇÕES NORMATIVAS
PRINCÍPIOS GERAIS DO DIREITOCOSTUMES

O princípio da legalidade na Administração Pública

No âmbito do Direito Administrativo, o princípio da legalidade assume uma forma ainda mais rigorosa. A Administração Pública, por estar intrinsecamente ligada à vontade legal, deve operar estritamente dentro dos parâmetros estabelecidos por ela. Enquanto o cidadão comum tem liberdade para realizar qualquer ação que não seja explicitamente proibida, o gestor público só pode tomar ações quando tiver uma autorização clara de uma norma legal.

Essa lógica confere segurança jurídica ao cidadão, ao mesmo tempo em que exige da Administração atuação vinculada e responsável. Essa interpretação encontra apoio doutrinário, como ensina Hely Lopes Meirelles, ao afirmar que os preceitos administrativos, por serem de ordem pública, não podem ser modificados por simples acordo entre as partes envolvidas, devendo sempre observar os poderes-deveres instituídos pela legislação.

A legalidade como fundamento do Direito Tributário

Já no Direito Tributário, o princípio da legalidade assume uma conotação ainda mais restritiva. O artigo 150, inciso I, da Constituição Federal, estabelece de forma categórica:

“Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: I – exigir ou aumentar tributo sem lei que o estabeleça.”

Esse dispositivo é uma expressão clara do princípio da legalidade tributária, que exige que tanto a instituição quanto o aumento de tributos estejam sempre respaldados por lei formal, afastando a possibilidade de regulação por atos infralegais ou discricionariedade administrativa.

O princípio da legalidade no Direito Penal e a exigência de lei formal

No âmbito penal, a rigorosidade na aplicação do princípio da legalidade é ainda mais acentuada. O inciso XXXIX do artigo 5º da Constituição estabelece que

“não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal.”

Essa disposição assegura que o Estado não pode punir comportamentos que não estejam previamente especificados como crimes em uma legislação formal, garantindo, desse modo, a previsibilidade do direito penal e protegendo as liberdades individuais. É proibida a elaboração de crimes ou penas através de atos normativos infralegais ou por analogia, exceto quando isso favorecer o acusado.

Diferença entre princípio da legalidade e reserva legal

Juntamente com o princípio da legalidade, aparece um conceito que é comumente confundido: a reserva legal. Apesar de estarem profundamente interligados, esses termos não têm o mesmo significado.

A reserva legal é uma exigência constitucional que estabelece que certos assuntos devem ser regulamentados por meio de leis formais ou atos com força de lei. Um exemplo dessa exigência pode ser encontrado no § 2º do artigo 227 da Constituição, que estabelece:

“A lei disporá sobre normas de construção dos logradouros e dos edifícios de uso público e de fabricação de veículos de transporte coletivo, a fim de garantir acesso adequado às pessoas portadoras de deficiência.”

Outro exemplo está no artigo 37, inciso I:

“os cargos, empregos e funções públicas são acessíveis aos brasileiros que preencham os requisitos estabelecidos em lei […]”.

A legalidade pode ser atendida por qualquer norma que faça parte do conjunto de leis, desde que criada seguindo o processo legislativo adequado. Por outro lado, a reserva legal limita a atuação do Poder Legislativo, requerendo uma lei formal para abordar determinadas questões. Assim, embora todas as condutas se submetam ao princípio da legalidade, apenas áreas específicas — claramente definidas pela Constituição — estarão inclusas na reserva legal.

Essa distinção é corroborada por Alexandre de Moraes, ao esclarecer que a legalidade estabelece a necessidade de norma elaborada conforme o processo legislativo constitucional para impor obrigações, ao passo que a reserva legal aplica-se a matérias que exigem regulação exclusiva pelo Poder Legislativo, sem a participação do Executivo.

Bernardo Gonçalves também reforça essa distinção ao apontar que a legalidade é mais ampla, enquanto a reserva legal possui maior densidade normativa, exigindo lei formal mesmo nos casos em que se admita a existência de atos infralegais no sistema.

A aplicação da Súmula 473 do STF no controle de legalidade administrativa

O princípio da legalidade também encontra respaldo na Súmula 473 do Supremo Tribunal Federal, que assim dispõe:

“A administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornam ilegais, porque deles não se originam direitos; ou revogá-los, por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos, e ressalvada, em todos os casos, a apreciação judicial.”

Este é um conceito de significativa importância prática, pois possibilita à Administração Pública corrigir suas ações que sejam ilegais, garantindo a conformidade legal e a eticidade na gestão pública, seja por meio de uma ação voluntária, seja através da solicitação de terceiros ou do Poder Judiciário.

Hipóteses constitucionais de mitigação do princípio da legalidade

Apesar de o princípio da legalidade ser essencial e amplamente reconhecido, há situações excepcionais em que sua aplicação pode ser flexibilizada, como estipulado na própria Constituição Federal. Essas exceções ocorrem no contexto de medidas provisórias, no estado de defesa e no estado de sítio.

O artigo 62 da Constituição autoriza a edição de medidas provisórias pelo Presidente da República, com força de lei, em casos de relevância e urgência. O artigo 136, por sua vez, trata do estado de defesa, enquanto os artigos 137 a 139 disciplinam o estado de sítio.

Em circunstâncias excepcionais, a conformidade com a legislação pode ser ajustada temporariamente para viabilizar reações ágeis e eficientes a cenários de severa instabilidade institucional ou desastres.

Considerações finais sobre a centralidade da legalidade no Estado de Direito

Após examinar todos esses aspectos, é possível concluir que o princípio da legalidade não se limita a ser uma base da ordem constitucional, mas também se configura como uma proteção crucial para a operação ética e previsível das instituições públicas.

Entender suas diversas dimensões, desde a atuação como uma restrição ao poder até seus efeitos em áreas específicas do Direito, é uma prática essencial para todos que se envolvem no estudo e na aplicação da legislação no Brasil.

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