É cada vez mais frequente no Brasil que pessoas adquiram imóveis sem recorrer à assessoria jurídica adequada, seja por meio de contratos de gaveta ou até mesmo com escritura pública, mas sem o devido registro no cartório de imóveis. Nesses casos, mesmo que o comprador esteja na posse do bem de boa-fé, o imóvel ainda consta, formalmente, no nome do vendedor. Isso pode gerar sérios problemas, especialmente se houver dívidas contra o antigo proprietário, pois o imóvel pode acabar sendo penhorado em razão dessas obrigações.
Diante dessa situação, o instrumento jurídico cabível para proteger quem possui a posse ou mesmo a propriedade do bem sem ser parte do processo em que houve a penhora é o embargo de terceiro.
Fundamento Legal e Cabimento
O artigo 674 do Código de Processo Civil (CPC) prevê expressamente o cabimento dos embargos de terceiro. De acordo com esse dispositivo, pode ajuizar os embargos aquele que, sem ser parte no processo, sofrer constrição ou ameaça de constrição sobre bens que possua ou sobre os quais tenha direito incompatível com o ato constritivo.
Ou seja, os embargos não se limitam ao proprietário formal do bem. Também podem ser utilizados por quem detém a posse legítima ou possui algum direito reconhecido sobre o bem, ainda que esse direito não esteja registrado.
Quem Pode Ajuizar os Embargos de Terceiro?
O CPC é claro em estabelecer, no §1º do artigo 674, que podem opor embargos de terceiro o proprietário, o proprietário fiduciário e o possuidor. Isso inclui:
Quem possui contrato de gaveta;
Quem mora ou detém a posse do imóvel de forma legítima;
Quem comprou um imóvel, mas não o registrou;
O cônjuge ou companheiro que defenda posse de bens próprios ou da meação;
O adquirente de bens que foram declarados ineficazes por fraude à execução;
O credor com garantia real não intimado em atos de expropriação;
Aquele que teve bem constrito por desconsideração da personalidade jurídica, sem ter sido parte no incidente.
Prazo para Ajuizamento
Conforme o artigo 675 do CPC, o prazo para propor embargos de terceiro varia conforme a fase do processo:
Na fase de conhecimento, os embargos podem ser opostos a qualquer tempo, desde que ainda não tenha havido o trânsito em julgado da sentença;
No cumprimento de sentença ou execução, os embargos devem ser opostos até cinco dias após a alienação do bem (seja por iniciativa particular ou rematação), mas sempre antes da assinatura da respectiva carta.
Importante: caso o juiz identifique um terceiro com interesse no bem penhorado, poderá determinar que ele seja cientificado para, se desejar, ingressar com os embargos.
Foro Competente para o Ajuizamento
De acordo com o artigo 676 do CPC, os embargos de terceiro devem ser distribuídos por dependência ao juízo que ordenou a constrição, sendo processados em autos apartados.
Existe, contudo, uma particularidade em relação à penhora realizada por carta precatória:
Se a carta precatória for específica, ou seja, indicar o bem a ser penhorado, os embargos devem ser propostos no juízo deprecante (aquele que expediu a carta);
Se for genérica, apenas para localização de bens, e o bem for localizado e penhorado pelo juízo deprecado, os embargos devem ser opostos no juízo deprecado.
Essa distinção é essencial para evitar a propositura dos embargos no juízo errado, o que pode acarretar a extinção do processo sem resolução de mérito.
Conclusão
Os embargos de terceiro são uma ferramenta fundamental para proteger o direito de quem, mesmo não sendo parte em um processo, sofre com constrições sobre bens que possui ou sobre os quais tem legítimo direito. Especialmente no Brasil, onde é comum a aquisição informal de imóveis, conhecer esse instrumento é essencial tanto para advogados quanto para qualquer pessoa que deseje garantir segurança jurídica sobre sua posse ou propriedade. O conhecimento dos artigos 674 a 676 do CPC e a correta identificação do juízo competente são peças-chave para uma atuação eficaz.